Artigos e Publicações

Rescisão da Apólice de Seguro em Razão do Inadimplemento Contratual

O contrato de seguro visa prevenir o contratante/segurado de eventos futuros e incertos. Diante do contrato a Seguradora se obriga, mediante pagamento do prêmio, a assegurar objeto ou pessoa contra riscos predeterminados, ou seja, ocorrendo sinistro com o objeto do contrato, a Seguradora tem o dever de indenizar o Segurado ou o Beneficiário.

Para melhor compreensão da matéria, há necessidade de esclarecermos alguns termos utilizados no contrato de seguro, senão vejamos:

 Prêmio: É o valor que o segurado paga a seguradora pelo contrato de seguro, que pode ser parcelado ou em parcela única;

Segurado: É o contratante do seguro, via de regra, é o beneficiário do contrato de seguro nos casos de sinistro de bens materiais;

Segurador (Seguradora): É a empresa que garante o pagamento do seguro.

Beneficiário: É a pessoa indicada para receber o seguro nos casos de seguro de vida.

Por outro lado, antes de adentrarmos ao tema Central, existem aspectos intrínsecos e extrínsecos do contrato de seguro que devem ser observados neste ensaio. O código Civil em seu artigo 757 estabelece o contrato de seguro, suas partes e obrigações, senão vejamos:

Art. 757. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados.

Parágrafo único. Somente pode ser parte, no contrato de seguro, como segurador, entidade para tal fim legalmente autorizada.

Portanto, o contrato de seguro é sinalagmático, ou seja bilateral, pois seus efeitos resultam em obrigações para as partes. O instrumento que o representa é a Apólice de Seguro, necessária para sua comprovação, porém por mais ambíguo que possa parecer, o contrato de seguro é vigente independentemente da emissão da apólice de seguro. Vale salientar que é de caráter aleatório, onde o vencimento da obrigação da seguradora depende de um acontecimento futuro e incerto.

O contrato de seguro é considerado oneroso, haja vista que prevê vantagens para ambas às partes, onde um recebe o prêmio e a outra concede garantia de pagamento no caso de sinistro, sendo que o pagamento da indenização deverá ser realizado em dinheiro, conforme prevê o artigo 776 do Código Civil. Importante ressaltar que o fato da não ocorrência de sinistro, não descaracteriza o pagamento do prêmio, que deverá ocorrer.

Dito isso, passamos a analisar a questão Central que cinge o direito do Segurado ou beneficiário, em receber a indenização securitária mesmo sem o pagamento de uma ou mais parcelas do contrato de seguro.

Na grande maioria dos casos ocorrendo sinistro a seguradora verifica se o pagamento do prêmio foi realizado, constatando que não foi realizado o pagamento de uma ou mais parcelas do contrato de seguro, a Seguradora o rescinde, alegando inadimplência contratual, via de consequência nega o pagamento da indenização do sinistro.

Todavia, para rescisão do contrato de seguro há necessidade de constituir em mora do devedor, ou seja, é necessário que a Seguradora previamente notifique o Segurado informando que ele está em mora, a fim de que este tenha oportunidade de pagar o que deve, e reestabelecer o contrato com a seguradora. Portanto, a grosso modo, ocorrência atraso no pagamento de uma ou mais parcelas do prêmio do contrato de seguro, o segurador tem o dever de constituir em mora o segurado, informando-o que ele está em atraso no pagamento do seguro, caso não o faça, na ocorrência de sinistro, não poderá negar a pagamento da indenização.

Assim, a negativa da Seguradora em atender ao contrato de seguro em razão da falta de pagamento de uma ou mais parcelas do prêmio, constitui ato abusivo que é rechaçado por nossos Tribunais, incluindo o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJ/PR), vejamos o que diz os recentes julgados:

“STJ – RECURSO ESPECIAL REsp 1484547 MS 2014/0250457-2 (STJ) Data de publicação: 01/07/2015 Decisão: EM RECURSO DE APELAÇÃO – COBRANÇA DE SEGURO – NÃO PAGAMENTO DO PRÊMIO – CONSTITUIÇÃO EM MORA NECESSÁRIA… exigindo-se a prévia constituição em mora do contratante pela seguradora, mostrando… pagamento de prestação do prêmio do seguro não importa em desfazimento automático do contrato, pois exige…”

“TJ-PR – Apelação APL 14334459 PR 1433445-9 (Acórdão) (TJ-PR) Data de publicação: 03/10/2016 Ementa: DECISÃO: ACORDAM OS MAGISTRADOS INTEGRANTES DA NONA CÂMARA CÍVEL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ, POR UNANIMIDADE DE VOTOS, EM CONHECER E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. CONSÓRCIO VINCULADO A SEGURO DE VIDA EM GRUPO. OBRIGAÇÃO PRESTAMISTA. FALECIMENTO DO CONSORCIADO. LEGITIMIDADE PASSIVA DA ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIO. TEORIA DA APARÊNCIA.INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA NEGADA NA VIA ADMINISTRATIVA. RECUSA DE COBERTURA FUNDADA NA INADIMPLÊNCIA PARCIAL DO PRÊMIO. IMPOSSIBILIDADE. RESCISÃO OU SUSPENSÃO DO CONTRATO QUE DEPENDE DA PRÉVIA CONSTITUIÇÃO EM MORA DO SEGURADO PELA SEGURADORA. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA.1. Havendo a morte do consorciado, a empresa administradora do consórcio é parte legítima para responder pela quitação do contrato quando atua como intermediária e estipulante do contrato de seguro prestamista. 2. Não basta o atraso no pagamento de Apelação Cível nº 1.433.445-9 fls. 2ESTADO DO PARANÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇAparcela do prêmio para que se suspenda, automaticamente, a cobertura securitária, sendo necessária a prévia constituição em mora, por interpelação específica. Precedentes do STJ e desta Corte de Justiça. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR – 9ª C.Cível – AC – 1433445-9 – Foz do Iguaçu – Rel.: Coimbra de Moura – Unânime – – J. 22.09.2016)”

TJ-PR – Apelação APL 14231160 PR 1423116-0 (Acórdão) (TJ-PR) Data de publicação: 09/03/2016 Ementa: DECISÃO: ACORDAM os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar parcial provimento ao recurso de apelação, nos termos do voto do relator. EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA – INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA – FURTO VEÍCULO – RELAÇÃO DE CONSUMO – APLICAÇÃO DO CDC – CONTRATO DE ADESÃO – INTERPRETAÇÃO MAIS FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR – ATRASO PAGAMENTO DE PARCELAS DO PRÊMIO – RECUSA DO PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA, EM RAZÃO DA INADIMPLÊNCIA – IMPOSSIBILIDADE DE RESCISÃO UNILATERAL DO CONTRATO, SEM PRÉVIA INTERPELAÇÃO DA SEGURADA, A FIM DE CONSTITUÍ-LA EM MORA– REDUÇÃO DO PRAZO ORIGINAL DO SEGURO, NOS TERMOS DA TABELA DE AJUSTAMENTO DE VIGÊNCIA – DISPOSIÇÃO QUE COLOCA O CONSUMIDOR EM DESVANTAGEM EXAGERADA – ABUSIVIDADE DAS CLÁUSULAS QUE IMPLIQUEM EM LIMITAÇÃO DE DIREITOS – CLÁUSULA NULA DE PLENO DIREITO (ARTIGO 51 , IV , DO CDC )- COBERTURA SECURITÁRIA DEVIDA – VALORES DAS PARCELAS INADIMPLIDAS, NOS MOLDES ESTABELECIDOS NO CONTRATO, ASSIM COMO O VALOR REFERENTE À FRANQUIA, QUE DEVEM SER DESCONTADOS DO MONTANTE DEVIDO – DIÁRIAS DE ALUGUEL DE CARRO RESERVA – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE ALUGUEL, TAMPOUCO DA INDISPENSABILIDADE DO VEÍCULO – INVERSÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO – APELAÇÃO – PARCIAL PROVIMENTO. 1.- A relação das partes é de consumo, porque se enquadra nos conceitos de consumidor/fornecedor de serviços, nos termos do artigo 3º e parágrafos do CDC , portanto, a interpretação das cláusulas contratuais deve ser feita de maneira mais favorável ao consumidor. 2.- “O simples atraso no pagamento do prêmio não implica na suspensão ou cancelamento automático da cobertura securitária, fazendo-se necessária a constituição em mora do segurado por intermédio de interpelação específica.” (STJ, 4ª Turma, AgRg no Ag 1092900/SP, relator Min. João Otávio de Noronha, julgado em 05/05/2009, DJe 18/05/2009) (TJPR – 9ª C.Cível – AC – 1423116…

Assim, o contrato de seguro é tido como um contrato de adesão, ou seja, a outra parte não pode sugerir mudanças, e foram criados com intuito de atender ao mercado segurador, proporcionando assim uma forma mais rápida de contratação, já que as cláusulas destes contratos são pré-determinadas. Contudo, estes contratos geralmente possuem cláusulas abusivas, que são àquelas que trazem prejuízos a parte mais vulnerável da relação, cláusulas que colocam o consumidor em desvantagem, o que causa um desequilíbrio contratual e violam o princípio da boa-fé, razão pela qual, de acordo com o Artigo 51 do Código de Defesa, são consideradas nulas de pleno direito.

O mesmo ocorre no seguro saúde, pois de acordo com a Lei 9.656/98, que regulamenta os serviços de plano de saúde, para Seguradora/administradora do plano efetuar suspensão ou a rescisão do contrato é necessário o cumprimento de dois requisitos:

I – Que o segurado não efetuou o pagamento da mensalidade por período superior a sessenta (60) dias;

II – que o consumidor seja notificado de sua inadimplência, até o 50º (quinquagésimo) dia do vencimento da obrigação.

Assim, quando a Seguradora/Administradora cancela o plano de saúde sem dar nenhum aviso ao segurado/consumidor, a conduta é considerada abusiva, pois o consumidor é surpreendido e por vezes só descobre o cancelamento no momento em que precisa de atendimento.

O mesmo se aplica quando o consumidor paga regularmente o plano de saúde e por algum motivo deixa de quitar apenas uma parcela, porém continua pagando as demais, a Seguradora/administradora também fica impedida de cancelar o contrato, tendo em vista os princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato, previstos no Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor.

Nesta situação, mesmo com as parcelas do contrato de seguro em atraso, a Seguradora/administradora do plano não pode cancelar o contrato, caso não tenha constituído em mora o segurado, sob pena de responder pelos danos materiais e morais causados ao usuário, nos termos da Lei.

Esse também é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e da maioria dos Tribunais de Justiça dos Estados, incluindo o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná.

O presente artigo busca analisar as principais características e eventuais conflitos existentes na rescisão do contrato de seguro, em razão do não pagamento de uma ou mais parcelas do contrato de seguro, via de consequência a própria negativa de pagamento da indenização do sinistro, sempre confrontando com o entendimento de nossos Tribunais, da legislação vigente e das Doutrinas existentes.

Ademais, é fato notório que as seguradoras dificultam ao máximo o pagamento da indenização.

Com efeito, conclui-se que no caso de negativa de indenização por parte da seguradora no atendimento do sinistro em razão da falta de pagamento de uma ou mais parcelas do contrato de seguro, judicialmente é possível reverter a situação, pois o entendimento de nossos Tribunais é de que mesmo com a parcela em atraso, o segurado tem o direito de receber a indenização do sinistro (Acidente de dano parcial/total, roubo ou furto), caso a seguradora não o tenha constituído em mora antes da ocorrência do sinistro.

De outro canto, é importante observar que o prazo prescricional para ingressar com Ação de indenização em face da seguradora é de um ano, iniciando a contagem a partir do recebimento da informação por parte da seguradora que não vai efetuar o pagamento da indenização. Transcorrido este prazo, ocorre a prescrição do direito do segurado, ou seja, não mais poderá requerer a indenização.

Para enviar seu comentário, preencha os campos abaixo:

Deixe uma resposta

*

Seja o primeiro a comentar!

Por gentileza, se deseja alterar o arquivo do rodapé,
entre em contato com o suporte.
WhatsApp chat